Portugal já havia sido assolado pela primeira das invasões francesas, em 1807, como resposta ao furo ao bloqueio continental à Grã-Bretanha, decretado por Napoleão, o que, causou, a sensacional fuga da corte de Lisboa, para uns, ou a cobarde deserção real, para outros, tendo, apesar de qualquer um dos pontos de vista, deixado Portugal num limbo existencial.
Assim, quando nova horda de tropas francesas se aproximou da fronteira, a norte do Rio Minho, em inícios de 1809, o alvoroço voltou a instalar-se, desta feita, no norte de Portugal. De acordo com o Tratado de Fontainebleau, assinado entre França e Espanha, Portugal deveria ser despedaçado em três províncias, sendo que, Braga, ficaria inserida no Reino da Lusitânia Setentrional, que juntaria as actuais províncias do Minho e Douro Litoral, ou os distritos de Viana do Castelo, Braga e Porto.
Falhada a invasão francesa pela foz do Rio Minho, em fevereiro de 1809, as suas tropas marcharam pela Galiza, em direção a Chaves, tendo conseguido saltar para o lado de cá, através do vale do Rio Tâmega, a 9 de março de 1809. Descartada a opção de seguir para Vila Real, devido à maior escassez de recursos em relação a Braga, o Marechal Soult deu ordens para seguir em direcção à Capital do Minho, na expectativa, também, de obter um maior saque. Grosso modo, o objectivo napoleónico, era atingir Lisboa, depois de derrubadas as resistências em Braga e Porto.
À medida que se aproximavam de Braga, as tropas francesas enfrentaram uma resistência crescente por parte das forças portuguesas comandadas pelo general Bernardim Freire de Andrade, bem como das populações, milícias e ordenanças, mas que foram vencidas, pelas tropas de Soult, à passagem por Venda Nova, Ruivães e Salamonde. No entanto, os franceses começavam a perceber a dificuldade que iriam ter pela frente, com uma população que facilmente dava a sua vida, para enfrentar os invasores, espicaçada pelo repique dos sinos das igrejas, como alerta para o perigo que rapidamente se aproximava.
Assim, foi necessária mais de uma semana para as tropas francesas se aproximarem dos arredores de Braga, numa espécie de tenaz, entre o rio Cávado, Bom Jesus e a Falperra, com especial incidência para a Serra do Carvalho de Este. Neste local, durante três dias, deram-se ferozes combates, com os seus relatos a chegaram aos dias de hoje, dando conta de banhos de sangue, em que, a um minguo exército português, se juntou a população, com “homens, mulheres, crianças, idosos e padres, para enfrentar a horda invasora.
A loucura e incompreensão de um cenário de guerra, levou ao assassinato do General Bernardino Freire de Andrade e do Quartel Mestre General Custódio Vilas Boas – o “Engenheiro” e responsável máximo do projecto do Encanamento do Rio Cávado – em pleno centro de Braga por parte da população extremamente agitada. Estes apelavam à retirada de meios para defender o Porto, deixando Braga à mercê das tropas napoleónicas, o que foi entendida como uma atitude de cobardia ou conivência com os franceses, por parte da população bracarense.
Com o desaparecimento dos principais responsáveis pela Defesa de Braga e do Norte, e depois de mortos quase 400 combatentes na Serra do Carvalho, os 25.000 homens que compunham o exército francês, com cerca de 40 baixas mortais, no dia 20 de Março de 1809, avançaram sobre a Cidade de Braga, onde se registaram mais vítimas mortais, destruição generalizada e pilhagens. De notar que, os defensores de Braga, seriam em número muito aproximado ao da coluna militar francesa, mas apenas 5.000 homens estariam armados e, mesmo assim, com poucas munições.
Essas pilhagens acontecem em diferentes instituições do Concelho e da Cidade de Braga como a Confraria de Nossa Senhora da Consolação do Monte em Nogueiró, ao Convento dos Remédios e à Sé Catedral, com uma valiosa custódia, do tempo do Arcebispo D. Diogo de Sousa, ainda exposta num museu francês. Grande parte da população, sobretudo a feminina, foi forçada a abandonar a cidade, sabendo que as suas ruas seriam o próximo cenário de batalha, após a passagem dos franceses pelo Carvalho d´Este.
Apesar de “vinte mil pessoas terem abandonado em três dias uma cidade que aparentava conter todas as facilidades da vida”, bracarenses os houve, que enfrentaram a máquina de guerra de Napoleão, mas sem possibilidades de sucesso. No dia 20 de Março de 1809, na freguesia de Santiago da Cividade, foram mortos 11 homens, enquanto em Maximinos, foram 6 homens assassinados. Nesse mesmo dia, em São José de São Lázaro, 36 homens perderam a vida, demonstrando forte patriotismo, na luta contra as tropas invasoras.
Em São Vítor, a contabilidade foi feita mais tarde, tendo-se apurado 10 mortos às mãos dos franceses. Já na Sé, os invasores foram directamente responsáveis, pela morte de 12 civis. Assim, foram 75 as baixas mortais, causadas pelas tropas de Soult, nas freguesias urbanas de Braga. Outras estimativas, apontam a 2.000 mortos na defesa da Cidade, 400 homens feitos prisioneiros pelos franceses e toda a artilharia capturada. Do outro lado, o General Soult teve necessidade de instalar um hospital de campanha para tratar os seus 800 feridos.
As tropas francesas mantiveram-se em Braga, até ao dia 25 de Março de 1809, antes de marcharem rumo ao Porto. Nesse mesmo dia, Chaves era reconquistada, e o General Silveira, ponderou dirigir-se a Braga, para, num ataque surpresa, enfrentar a horda francesa. Porém, dias depois, e ainda em Chaves, tomou conhecimento de que a coluna militar francesa já havia entrado pelo Porto, ficando o plano sem efeito.
A invasão perpetrada pelas tropas francesas, deixou o país em geral, na desordem, com as populações locais também a rebelarem-se perante as instituições eclesiásticas. Como exemplo caricato, o Mosteiro de Tibães, que foi saqueado pela população circundante, como grito de revolta pelas suas péssimas condições de vida, à qual, ironicamente, acabaram por se juntar as tropas francesas. Com a fuga da comunidade religiosa de Tibães, os assaltantes levaram cereais como trigo e cevada, entre outros géneros alimentares, objectos litúrgicos, muitos objectos pessoais, utensílios de cozinha, deixando um rasto de vandalismo e destruição no Mosteiro, tendo apenas a valiosa Livraria e Sacristia se escapado.