A crise financeira agravou e a inflação tomou valores astronómicos. Os preços dos bens alimentares, do combustível, dos materiais de construção, (…), aumentaram sem que os salários reais da população os conseguissem acompanhar.
As rendas e os preços das casas não foram exceção. O problema é transversal a todo o país, é claro. Porém, é notória a crescente construção de “apartamentos de férias” em Esposende, assim como o aumento das rendas com preços incomportáveis para o cidadão comum.
Sendo um “privilégio da natureza”, um município com mar, rio, pinhal e monte, somos um destino procurado desde há muitos anos por aqueles que querem passar cá o verão. Enquanto antes vinham só passar férias, a tendência atual é para a compra por parte dessa fatia da população de uma segunda habitação no nosso município, com maior incidência nas freguesias com “fronteira” com o mar. Vemos ainda uma outra fatia da população que não trabalha em Esposende, e pouca vida faz cá, mas adquiriu casa de primeira habitação aqui pela qualidade de vida que não se tem nas grandes cidades.
O setor da construção está, portanto, virado para esse tipo de mercado. Só no último ano, “nasceram” dois ou três condomínios de apartamentos na vila de Fão, na zona de Ofir e em Apúlia. Orientados para quem? Certamente não para quem aqui sempre viveu e quer continuar a viver, e que não ganha mais do que o salário médio e, por isso, não aguenta pagar 190 mil euros por um T1.
Além disso, dificilmente se encontram casas e apartamentos a arrendar por menos de 500 euros, seja de tipologia seja, pelo concelho fora.
Ora, temos vários problemas relacionados com a habitação no nosso município.
Primeiro estamos a ficar com cada vez mais casas de segunda habitação, de baixas tipologias, que pressionam o mercado da habitação e reduzem o parque habitacional do município. A consequência são os preços muito altos das casas e dos apartamentos. Outro problema é o aumento das rendas que os salários reais não conseguem acompanhar. Ainda vemos outra questão que é a degradação dos centros históricos, com casas em estado devoluto e grande dificuldade dos proprietários em restaurar. O quarto problema que identifico é a falta de habitação social e habitação a preços controlados.
E soluções? O governo anunciou um conjunto de medidas “ (…) mais imediatas que visam fazer frente aos impactos económicos com efeitos diretos nos rendimentos das famílias e no acesso à habitação”, segundo o Decreto-Lei n.º20-B/2023, de 22 de março. Apesar de apresentarem medidas positivas, não consegue responder ao problema estrutural da habitação no país.
Para isso, serão precisos incentivos mais fortes à construção de tipologias apropriadas à fixação da população. Os municípios são um dos níveis de governo mais próximos do cidadão, e podem e devem agir, implementando políticas públicas municipais focadas para os problemas específicos dos seus territórios. O PDM (plano diretor municipal) é já um instrumento muito importante neste particular da habitação, pois define o quadro estratégico de desenvolvimento territorial dos municípios, que tem o poder de restringir (ou não) a construção.
No caso de Esposende, muito pode ser feito. Desde já, discriminar positivamente aqueles que construírem tipologias de acordo com o que é o mais procurado pelos esposendenses que se querem manter cá. Claro está que seria uma política dinâmica que teria de base um estudo com uma certa regularidade (a cada 3 anos, por exemplo) para identificar aquelas tipologias.
Imagine-se: se o estudo comprovasse que as tipologias mais procuradas em Esposende eram os T2 e T3, aqueles que quisessem construir T1 teriam obrigatoriamente que construir uma quota-parte de T2 ou T3. Por exemplo, por cada T1 que constrói, deve construir dois T2, sob pena de agravamento
nas taxas de construção e licenciamento. Ou ainda, os que construíssem tipologias menos desejadas teriam de reconstruir casas devolutas dos centros históricos. É evidente que os preços destes imóveis ou o valor das rendas dos mesmos teriam que ter máximos fixados.
Vejamos que a Câmara Municipal de Esposende não constrói habitação há muitos (demasiados!) anos. Essa, sim, seria a melhor maneira de colocar no concelho habitações a preços controlados, que fixassem aqui população. Não podemos esperar que os jovens emigrem e depois lamentarmo-nos do sucedido…
Com aperfeiçoamento das ideias apresentadas, e pondo em prática estas e outras tantas, seriamos certamente um município exemplo no que concerne a resposta à crise da habitação. Nascemos no privilégio da natureza e só pedimos poder continuar a cá viver!